Reflexão: que ilusão a minha…
Quando começamos esse isolamento há quase três meses, em algum momento, eu parei e pensei… não, na verdade, eu acreditei mesmo que a chegada de um vírus mortal em nossas vidas teria o poder de fazer com que as pessoas parassem para pensar e rever seus conceitos. Olhar para dentro de si, de suas casas e valorizar o que realmente tem valor. Rever a qualidade da vida, das relações. Entender que o mais importante é o abraço que ficou suspenso, é o sorriso dividido, é a mão dada que estaria esperando que a saúde fosse restabelecida para que pudéssemos nos ver e nos abraçar de novo.

Achei que as pessoas iam valorizar mais seus amigos, exatamente porque iriam sentir na pele a distância física deles.
Achei que iam proteger seus pais, porque a crueldade maior disso tudo dizia respeito à segurança deles.
Achei que iam perceber o que é fundamental e o que é supérfluo. Acreditei que a maioria das pessoas poderia se tornar mais humana e não olhar apenas para o próprio umbigo, percebendo assim que nem todos tem a sua condição, e que poderíamos lutar contra isso para que juntos, logo, pudéssemos abrir as portas de novo.
Tivemos a oportunidade de pensar…
Ah, como fui ingênua ao achar que seriam capazes de pensar…
Que ilusão acreditar que a força do cuidado, a empatia, a preocupação com o outro, que a união por algo indispensável seria maior do que a força do capitalismo.
Que ilusão a minha achar que a importância do amor seria maior do que a importância do dinheiro. Que a saúde seria mais importante que a economia.

Que ilusão acreditar que a mudança seria para melhor.
Que ilusão achar que as pessoas pudessem realmente estar preocupadas com as vidas perdidas e as que poderiam se findar.
Que nada! Importante mesmo é encher os shoppings e as ruas de comércio. O importante é comprar, gastar, cuidar da aparência. Sim, não é a essência; o que conta é a aparência.
Não culpem apenas o governo. A culpa é sua, que não aprendeu nada. A culpa é sua, que vai morrer e matar… Ah, e não diga que não sabia que está errado quando sua “liberdade” de ir e vir fere a liberdade de existir do outro.
O poder não deveria caber ao seu dinheiro, ao seu consumo ou ao seu individualismo. O poder deveria ser dado pela união de todos contra um único inimigo.
Mas acho que você ainda não está preparado pra conversar sobre isso.
Saia! Vá ao shopping, acolha sua canalhice disfarçada de inocência e assuma sua parcela de culpa nesse genocídio assistido. Não como coadjuvante, mas como o protagonista que aperta o gatilho.
Adriana Giampietro