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Sistema de tortura e de humilhação, diz ministro do STF sobre caso Mariana Ferrer

Indignação contra estupro culposo com que promotor e juiz livraram empresário de violência em caso da jovem Mariana Ferrer supera eleições dos EUA nas redes

São Paulo – Cenas estarrecedoras. Sistema de Justiça de tortura e de humilhação. Esses foram alguns dos termos utilizados pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes para definir a audiência que, em setembro, qualificou de “estupro culposo” os ataques contra a produtora de eventos Mariana Ferrer. O empresário André de Camargo Aranha foi absolvido da acusação de estupro. As imagens que deixaram indignados o ministro do STF, políticos, celebridades e mulheres de todo o mundo foram divulgadas nesta terça-feira (3) pelo Intercept. E deixaram as redes sociais em polvorosa, colocando no topo dos assuntos as #estuproculposo e #justicapormariferrer. As manifestações nas redes deixaram para trás a eleição nos Estados Unidos e chegaram a mais de um milhão de resultados no Google Trends.

Para Gilmar Mendes, as cenas da audiência de Mariana Ferrer são estarrecedoras. “O sistema de Justiça deve ser instrumento de acolhimento, jamais de tortura e humilhação”, afirmou nas redes sociais. O ministro cobra que os órgãos de correição apurem a responsabilidade dos agentes envolvidos, inclusive daqueles que se omitiram.

Fotos e humilhação

O advogado de defesa de André de Camargo Aranha, Cláudio Gastão da Rosa Filho, exibiu durante a audiência fotos sensuais de Mariana, que era modelo profissional, para “provar” que a relação sexual teria sido “consensual”. Afirmou que eram como imagens “ginecológicas” e que “jamais teria uma filha” do “nível” de Mariana. Depois de levar a jovem às lágrimas, o advogado de defesa fala em “choro dissimulado, falso e essa lábia de crocodilo”.

A humilhação seguiu sem nenhuma intervenção do juiz. A audiência foi encerrada com a absolvição de André de Camargo Aranha. Para o promotor, ele não poderia saber que Mariana não tinha condições de consentir a relação. E, assim, não existiria uma “intenção” de estuprar, disse. A argumentação de “estupro culposo” foi aceita pelo juiz. Um crime não previsto em lei e, portanto, o estuprador não foi condenado.

A deputada Jandira Feghali observou que uma petição pública contra a conduta do juiz o juiz Rudson Marcos, da 3ª vara Criminal de Florianópolis, e do promotor Tiago Carriço, no caso Mariana Ferrer, superou 2,3 milhões de adesões até esta tarde.

Estupro culposo, pqp

A atriz Bruna Marquezine foi uma das milhares de pessoas que se manifestaram contra a sentença. “’Estupro culposo, pqp”, resumiu em suas redes sociais. A também atriz Bruna Linzmeyer questionou: “Vocês acham possível estuprar SEM QUERER? Estupro culposo é o ato de estuprar alguém sem intenção de estuprar ou de julgar alguém sem a intenção de condenar? #Estuproculposonãoexiste”, afirmou.

A cantora Luísa Sonza afirmou estar com medo do que Brasil está virando e pediu: “#justicapormariferrer”. Cantor e compositor, Nando Reis foi categórico: estupro culposo não existe, estupro é crime.

Vergonhoso é pouco

Clubes de futebol também usaram suas redes sociais para manifestar que estupro culposo não existe. Em dia de eleição nos Estados Unidos, os pedidos de justiça para Mari Ferrer ganharam espaço ao longo do dia e o assunto tornou-se o mais mencionado no Google.

O governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), com 30 anos de atuação profissional na área jurídica, como juiz, professor e advogado, disse já ter ouvido muitos absurdos. “Mas ‘estupro culposo’ é a primeira vez. Que essa violência contra o Direito não prospere.”

A deputada federal Margarida Salomão (PT-MG) lembrou que há 50 anos o caso Ângela Diniz tornou-se símbolo de como a Justiça operou para humilhar as mulheres. “Uma mulher assassinada, mas tratada como a vilã da história. Hoje, o caso Mariana Ferrer e as imagens do julgamento confirmam que nada mudou”, disse. “Chamar de vergonhoso é pouco.”

“A jovem foi estuprada e ainda foi humilhada! Ela é a vítima! Meu repúdio à humilhação da vítima e a essa sentença q libera estuprador!”, postou a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS).

Efeito Bolsonaro

O presidente da República, quando deputado federal (PSL-RJ), afirmou que não estupraria a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) porque ela não merecia. Em vídeo, nas suas redes, a parlamentar destacou que os legisladores precisam dizer claramente que o conceito de estupro culposo não existe em nenhuma parte do Código Penal.

“Lendo as reportagens, a gente vê não apenas o preconceito, a cultura do estupro, a violência de toda forma, a humilhação da vítima. É inaceitável que se crie essa ideia de estupro culposo. É preciso que a lei seja cumprida. Estupro é crime hediondo.”

A fala do ex-capitão agora na posição de presidente da República foi relembrada hoje por muitos posts nas redes sociais. A fotógrafa Paula Marina disse: “Sim, isto é efeito Bolsonaro. Estão dando permissão aos homens para nos estuprarem. E não, não estou exagerando”.

No Brasil, 135 mulheres são estupradas todos os dias, lembrou post do ex-prefeito de São Paulo e ex-ministro da Educação, Fernando Haddad.

Reações indignadas

“A justiça dos homens criou agora o ‘estupro culposo’ que é quando ‘não se tem a intenção de estuprar’. A distopia patriarcal segue seu curso distribuindo e ratificando as violações apontadas para certos corpos. #Estuproculposonaoexiste“, protestou a deputada estadual Erica Malunguinho (Psol-SP).

Fonte: Rede Brasil atual

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