Início do Ano Letivo
Logo nos primeiros minutos do dia, mais um ano letivo se iniciava. A inspetora da escola entrou, puxando pelos braços uma criança muito assustada.
O corpinho esguio, o cabelinho espetado para o alto, a camiseta preta e a calça jeans, em desconformidade com o uniforme da rede escolar.
Perguntei-lhe o seu nome, e com a voz embargada, misto de choro e medo, ele respondeu.
Perguntei à inspetora o que havia acontecido com ele, e ela respondeu que ele não queria entrar na sala de aula.
Toquei em suas mãos e pude sentir o frio. Percebi pela sua postura que ele estava assustado. Tentei persuadi-lo a relaxar, a se sentir acolhido. “O que houve?
![](https://www.tribunadebarueri.com.br/wp-content/uploads/2023/12/imagem_2023-12-18_185959490-720x1024.png)
Por que você está assustado?”, perguntei. Ele respondeu: “Meu pai me deixou aqui, eu quero ficar com a minha irmã.”
Essa frase me tocou, e eu me lembrei do meu primeiro dia de aula.
Lá estava eu, no meio daquela gritaria, com todos falando mais alto que o outro, cada um querendo se fazer ouvir.
E ficava aquele barulho ensurdecedor. Ninguém me notou, com certeza. Eu estava assustado, inquieto, parecendo um animalzinho indefeso, sem saber direito onde ir ou o que fazer.
Procurava segurança, queria estar perto da minha mãe, das minhas irmãs, mas não havia jeito. Não podia dar na cara o que estava sentindo.
As expectativas eram várias, e eu mesmo dizia em casa que queria ir para a escola. Então, chegou o dia, e ali estava eu.
Foram vários dias assim, um misto de medo, ansiedade e angústia.
Quando estava chegando a hora de ir para a escola, vinha o apavoramento. Hoje, quando vi aquele garoto, me vi, me lembrei dos meus primeiros dias no grupo escolar do jardim Jussara.
Revivi os meus medos, minhas angústias, quanta insegurança. E ninguém me notou, não houve acolhimento, não havia uma mão generosa como a da inspetora de hoje para tocar no meu ombro, me encorajar.
Confesso que ainda hoje, no início dos anos letivos, tenho as mesmas sensações de antes. E olha que tudo começa na véspera, quando termina o programa jornalístico do domingo à noite, quando o apresentador se despede dando boa noite.
Durmo mal, fico ansioso, chego na escola com uma vontade louca de desistir de tudo. Aí vem o senso de responsabilidade, sei que sou eu que devo aprender a lidar com os meus fantasmas, tenho as minhas responsabilidades e obrigações para arcar.
Não sinto prazer em fazer, mas me dá uma pequena satisfação.
Provavelmente, a falta de entusiasmo foi tirando-me a empolgação, e o tempo se encarregou do resto.
Sou um velho beija-flor, que conhece o adocicado do néctar, vôo de flor em flor, não pelos néctar, mas sim para que as primaveras não deixem de existir, muito embora as flores não me cheguem.
Garoto, se assuste, mas não desista.
A vida vale a pena, os desafios existem para serem superados, e não busque reconhecimento, fama ou sucesso.
Prime por sabedoria e inteligência, e o resto lhes serão acrescentados, não na forma do mundo, mas sim no modo de viver e amar.
Bom ano letivo para todos nós.
Crônica Poética, escrita pelo professor Rosalvo Silva Filho