Reflexão: 14 de maio de 1888
Tem um provérbio africano que diz “que até que os leões escrevam suas próprias histórias, os caçadores serão os heróis”.
É exatamente por isso que uns e outros acreditam que alguma homenagem deva ser feita à Princesa Isabel neste 13 de maio. Isabel, na verdade, apenas oficializou algo que as classes trabalhadoras – formadas, no século de XIX, por homens e mulheres negras e negros livres, libertos e escravizados, além de alguns poucos brancos – e lideranças políticas como Luiz Gama, José do Patrocínio, André Rebouças e Ferreira de Menezes – todos eles, grandes intelectuais negros –, inspirados por mulheres negras rebeldes, como Aqualtune, Dandara, Teresa de Benguela, Zeferina e Luíza Mahín, já haviam lutado para tornar realidade: a abolição da mão de obra escrava e a restituição de humanidade a negros e negras. Eles e elas, sim, são os verdadeiros heróis e merecedores de todas as homenagens. Por isso, hoje não quero falar sobre o dia 13, mas sobre o dia 14 de maio de 1888.
A abolição, da forma como foi feita, não previu medidas de inclusão social, escolarização, moradia ou empregabilidade pra quem deixava a condição de escravizado. Por outro lado, houve várias políticas públicas de incentivo à imigração europeia, com doação de terras e promessas de emprego, com o objetivo declarado de “embranquecer” a nação. Bem, do ponto de vista demográfico, o objetivo não deu certo: nós, negras e negros, somos mais de 50% da população brasileira.
Tentaram nos eliminar, mas nós sobrevivemos. Mas não queremos apenas sobreviver: queremos Bem Viver. Queremos justiça social. Queremos o fim da necropolítica, da política de morte, que aprisiona, estereotipa e mata os corpos negros (trans e cis). E não me venham falar de igualdade. Se fôssemos todos iguais, negros e negras não teriam cinco vezes mais chance de morrer de covid-19 do que pessoas brancas. Nem a doença é democrática nesse país. A escolha de quem vive e quem morre é racista.
Texto de: Erika Hilton